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MORTE E RESSURREIÇÃO: o limite humano na grandiosidade de Deus

Morte e Ressurreição são temas caros e fundamentais para a fé cristã. Ambos os temas são ricos e, às vezes, não são tão bem entendidos e aprofundados dentro da comunidade eclesial e, também, pela maioria dos cristãos. Tal situação pode ocorrer por diversas razões, como pretendemos apresentar.

A morte, seguramente, nos questiona, ela nos assusta e nos incomoda. Em alguns casos ela causa medo e espanto, sofrimento e dor. Estes sentimentos fazem com que a beleza que se encontra na morte, ou mais seguramente, na interpretação teológica (e religiosa) que damos a ela, não seja percebida. De certa forma, é normal que ocorra esta situação, pois se trata de uma questão humana. O ser humano não vive sozinho, ele cria laços, forma vínculos, família, amigos, vive em relações de fraternidade e de amor. Nestas condições, a morte é vista como rompimento, como separação, como fim, ela traz dor e angústia. A incerteza humana não cede espaço para a certeza da fé, pois o limite humano ganha espaço na pequenez da nossa condição. O fato de termos consciência da morte nos provoca reações: nós a afastamos o máximo possível; nós a ignoramos, fazendo com que passe ao longe, ou, quando chega, que tenha um desfecho rápido.

Se passarmos para a ressurreição a ideia fica ainda mais difícil, pois a morte é uma realidade concreta que está sempre diante dos nossos olhos, já a ressurreição é uma realidade entendida (ou aceita) apenas pela fé. Além disso, ela é algo distante, que não visualizamos, é algo que não sabemos, onde todo aquele que crê é assombrado pelo mesmo fantasma daquele que não crê. Nas certezas da fé, habitam as incertezas humanas da falta de fé, que no interior humano duelam entre si. Pelo fato da fé ser uma expressão humana, ela está presa na limitariedade humana e a única forma de sair e de encontrar o seu destino (Deus) é abrindo-se à graça divina, acolhendo na ternura a revelação que vem, fonte de toda a verdade e fé.

No entanto, este discurso é distante para a maioria das pessoas, uma vez que não se entende a ressurreição. Acredita-se, em alguns casos, que a ressurreição é um retornar a esta vida, assumindo este mesmo corpo e voltando às mesmas origens. Tanto de forma bíblica quanto de forma científica isso é irreal. Cientificamente, é impossível, pois o nosso corpo é formado de matéria e esta se transforma constantemente. O mesmo ocorre pelo aspecto bíblico, que entende a morte, a partir do Novo Testamento, como uma passagem definitiva para o encontro com Deus. Não se retorna a esta vida, mas se leva esta vida para junto de Deus, onde tudo será transformado e justificado na misericórdia e no amor universal. O que era tempo e perene é acolhido na ternura de Deus, transformando-se em eterno. Para tanto, a ressurreição sempre foi vista nas Cartas paulinas e pelos demais autores do Novo Testamento como uma profunda transformação (cf. 1Cor 15), como um resgate do limite humano pela grandiosidade de Deus. Na morte, a esperança se transforma em certeza e a certeza abre espaço para a visão beatífica de Deus, que nos revela quem nós somos e quem é Deus em nós.

Por fim, entendemos que morte e ressurreição devem ser contempladas sempre à luz da fé. Diante disso, o racional dá lugar ao mistério e no mistério contemplamos e fazemos reverência, pois entendemos que a última resposta é dada por Aquele que pronunciou a primeira palavra: Deus.

 

 

Cesar Kuzma é teólogo leigo, casado, assessor da CNBB e do CELAM, presidente da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião – SOTER. Doutor em Teologia pela PUC – Rio, é Professor/Pesquisador do Departamento de Teologia da Pontifícia Universidade Católicado Rio de Janeiro – PUC-Rio. Autor de: O futuro de Deus na missão da esperança: uma aproximação escatológica. 1. ed. São Paulo: Paulinas, 2014; Leigos e Leigas: força e esperança da Igreja no mundo. 2. ed. São Paulo: Paulus, 2009.